quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Temendo o diabo errado. Um enredo sobre a miopia política.




Se estamos ou não estamos em processo de apocalipse eu não sei.
Mas efetivamente a sensação é essa.
Estamos fazendo aquele barulho irritante de quem suga pelo canudo o final da água no fundo do copo.
A água vai acabar. Este é um dado inexorável. A água vai acabar muito antes do imaginado. O castigo veio a galope.
Estaríamos nós todos sendo punidos pelos céus?
Acredito que sim!
Mas nosso pecado não é exatamente provocar a ira de deus. Muito mais grave foi que durante anos tememos o diabo errado.
Somos uma legião de pregadores missionários, detentores da verdade absoluta, definhando no sol escaldante e carregando um deus debaixo do sovaco. Julgamos saber muito sobre esse deus, mas ignoramos por completo a obra e a cara do tinhoso.
Fugimos de um inferno mitológico que se situa além da imaginação, e não nos demos conta que já estamos cercados num inferno que a gente mesmo construiu.
Junto com a água vai acabar a energia.
Pela falta d'Água se culpa a Deus.
Pela falta de luz se culpa o governo.
Mas não importa! Estamos todos temendo o diabo errado.
O fim do mundo está sendo televisionado.
É impossível assistir um telejornal. Não há trégua. As notícias são sempre devastadoras, raivosas, com baba escorrendo pelo canto da boca do comentarista.
A televisão formou uma geração de despolitizados histéricos. Gente que desconhece a história, mas repete o comportamento violento, intolerante, intransigente e messiânico de outros tempos. Todos com um deus debaixo do sovaco, mas temendo o diabo errado.
A esquerda parece contaminada pelo pânico geral do apocalipse. Todos se acusam e se culpam pelo fim do mundo. Enquanto uma parte repousa e espera o fim dos tempos no ar condicionado, muito satisfeita consigo mesma, uma outra parte que prega nas ruas diz não falar em nome de deus. Dizem inclusive que não acreditam em deus. Mas ainda assim temem duas dezenas de diabos. Cada um no seu segmento se divide em sub seguimentos sub ideológicos. E o diabo sempre estaria ao lado de quem não reconhece a importância do seu segmento.
As vezes o povo só irrita, porque ele não entende nada do que se fala nos grandes salões da guarda real filosófica da esquerda muito esquerda pra caralho. Além do mais, o povo certas vezes tem a incômoda mania de contrariar em seu cotidiano a teoria que deu tanto trabalho para ser digitada e postada nas redes sociais.
Cacete! O fim do mundo parece realmente estar próximo! Diziam que o mundo iria acabar em algum momento na virada do milênio. Talvez ele já tenha acabado e estejamos todos nesse inferno quente, sem água e cheio de notícias tristes.
Pode ser também que esse inferno tenha prazo de validade. Que estejamos todos sendo novamente enganados. Tão logo o coisa ruim consiga o que ele quer teremos a súbita percepção de que estaremos no paraíso. Inundados por uma enxurrada de notícias boas e aí então obrigados a acreditar que tudo vai bem.
Mas enquanto isso, seguimos cada um com seu deus guardado debaixo do sovaco e temendo o diabo errado.
Enquanto a gente culpa o diabo do partido político do vizinho pelo apocalipse, o satanás permanece oculto. Um ser que não tem rosto nem forma. É como um espírito maligno que ronda nossas vidas.
A sociedade se digladia. E o Mercado (este sim com eme maiú$culo) sorri serenamente e despreocupado. Ele já sequestrou o Estado, a imprensa, a cultura, a história. Roubou o indivíduo de seu próprio tempo e de seu próprio destino.
Acontece que é muito complexo falar do Mercado.
Melhor mesmo nos ocuparmos dos nossos capetinhas. Os azuis culpam os vermelhos. Os vermelhos acusam os azuis. As outras cores se misturam como podem. 
Os políticos são bem pagos para serem os bois de piranha do nosso tempo. Seja no Brasil, seja no resto do mundo.
E quanto a nós? Estamos sendo punidos por nossa ignorância. Por carregar cada um o seu deus debaixo do sovaco e temer o diabo errado.

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