quarta-feira, 29 de outubro de 2014
Ressentidos pregam o fim da caridade
Particularmente, nunca achei que o conflito de ideias e a transparência de posições, ainda que no limite do absurdo, fossem ruins para o Brasil, como alguns temem. Estamos colocando as cartas na mesa que estavam escondidas em mitos de democracia racial e "brasileiro povo mais generoso e acolhedor do mundo".
Voltando à questão da esmola e da caridade. Creio que esta chamada "divisão da sociedade" (que não considero que seja verdadeira) deixa seus primeiros legados. Não acho ruim que o Estado seja o regulador da reparação social e faça a intermediação desta relação entre indivíduos em condições sociais tão diferentes.
A caridade é um dos gestos mais sublimes do ser humano. Algo que nos torna mais fortes. Aos cristãos, é a atitude que mais nos aproxima dos ensinamentos de Jesus.
Mas a caridade tem que ser algo que sai do coração, não um instrumento de dominação e superioridade de um indivíduo sobre outro.
Existe a esmola que estabelece uma relação oculta entre o senhor e o escravo. O vivo e o zumbi.
Talvez seja este um dos motivos do ódio contra o Bolsa Família. A quebra da relação de dependência e servidão. Dominador é dominado. Quem manda é quem obedece.
Não é de todo ruim quando alguém manda procurar o Estado para dar assistência. É dele o papel de reparar, corrigir distorções, redistribuir riquezas e promover justiça.
Ora, irão dizer, que apenas mudou o "Senhor", mas que as pessoas continuam servindo.
Ainda assim, entendo que seja melhor que haja uma relação com as instituições públicas do que de um indivíduo sobre outro.
Particularmente, continuarei a fazer caridade. E não porque minha candidata ganhou, mas porque isso me faz bem. Mas a verdadeira caridade é você entender a humanidade do outro. Compreender suas motivações e sua história de vida. E para além de tudo isso, lutar por um país mais justo, igual e sem pessoas miseráveis que precisem se submeter umas às outras.
terça-feira, 28 de outubro de 2014
Quem mais ganhou a eleição, além de Dilma?
As eleições de 2014 entrarão para a história como um dos maiores momentos da esquerda brasileira. Mas por que esta vitória em especial merece destaque?
Na busca por espaço político, o PSDB surfou na onda conservadora. Ao atrair para seu campo figuras do fundamentalismo religioso, articulistas raivosos e figuras políticas ligadas ao autoritarismo e defensoras do regime militar, os tucanos conseguiram terceirizar sua comunicação com uma massa do eleitorado potencialmente reacionária.
A mobilidade social, num primeiro momento, traz o sentimento de euforia. Logo em seguida, o sentimento é de preservação e de conservação do status adquirido. A memória da classe média ainda é de pobreza.
O discurso ultra-conservador emerge com maior facilidade, pois depende menos de coerência. A grande mídia colaborou decisivamente para disseminar o medo em quem se sente permanentemente na beira do abismo, sem representação institucional e que acredita que seu sucesso é resultado unicamente de seu mérito pessoal.
A desigualdade social já faz parte da vida mental dos brasileiros. A inclusão (ainda que insuficiente para equalizar injustiças históricas) de milhões de pessoas no mercado de consumo e por consequência na vida cotidiana das metrópoles, exerce uma pressão invisível para que os que já estavam estabelecidos também sejam premiados com a subida de mais alguns degraus na escala social, sob pena de se sentirem automaticamente mais pobres, quando na verdade estão mais iguais.
Ao agregar as forças políticas mais conservadoras e prejudicar o conteúdo programático de seu projeto, os debates transbordaram à avaliação de desempenho do governo Dilma, que nitidamente enfrentava problemas.
As discussões políticas tradicionais foram convertidas em fábulas de ódio, repulsa e preconceito.
Ainda que as manifestações mais graves de intolerância não saíssem da boca do candidato Aécio, havia um contingente de apoiadores ligados a diferentes igrejas, grupos conservadores que realizavam esta função. As redes sociais tornaram-se um canal de manifestação de sentimentos inconfessáveis, impossíveis de serem transmitidos no horário eleitoral.
O antipetismo odioso se tornou uma espécie grife de distinção e pertencimento social. No esgoto da internet, corriam manifestações racistas, homofóbicas, machistas e de preconceito social.
A candidatura de Aécio, sem conexões sólidas com os movimentos sociais e a sociedade civil organizada, conseguiu abrir a caixa de pandora que liberou os mais terríveis monstros que estavam adormecidos e canalizou um coquetel de sentimentos abrigados no antipetismo e no desgaste dos doze anos de governo Lula e Dilma.
Ao misturar política e comportamento, tornou-se mais fácil para um contingente de eleitores que estava descolado do debate político cotidiano identificar nas candidaturas diferenças mais sensíveis que fazem sentido em seu modo de vida. Ao perceber que a candidatura de Aécio abrigava o discurso religioso, homofóbico, regionalista e que muitos de seus eleitores exprimiam manifestações preconceituosas, uma camada importante do eleitorado, que não necessariamente defendia o Governo Dilma, passou a apoiar sua candidatura.
É possível dizer que boa parte da galera que estava nas ruas no mês de junho de 2013, ao final do processo eleitoral se juntou às fileiras da candidatura de Dilma.
O comportamento violento e truculento da direita, unificou os setores progressistas da sociedade. Seja dentro dos partidos políticos, ou até mesmo em parte do eleitorado que não se sente representado pela política tradicional e estava disposta a anular o voto.
Para o próximo governo, a presidenta deverá contar com muito mais do que a base de apoio parlamentar. Precisará sedimentar suas conexões com a sociedade civil e com os movimentos sociais. Deverá disputar espaços em setores da classe média que foram desprezados. Neste cenário em que a estratégia de parte da direita parece ser incendiar o país e não reconhecer os fundamentos mais básicos da democracia, não há outro caminho, senão politizar a sociedade. Falar, ouvir, acolher. Superar a dinâmica das discussões obscurantistas e preconceituosas.
As manifestações de preconceito e ódio e preconceito após a confirmação da vitória da presidenta para um novo mandato nada mais é do que o sintoma de uma derrota histórica.
Porque uma derrota eleitoral se supera com a correção de rumos e angariando mais apoios. Mas, ao deixar de reconhecer as motivações e escolhas da maioria dos brasileiros, revela-se a falta de espírito público e o esgotamento de um discurso que não tem mais tempo nem espaço para prosperar.
Certas derrotas nos fazem mais fortes e nos colocam num estágio mais avançado para uma futura vitória. Porém, existem derrotas que efetivamente nos tornam menores. Que expõem e deixam evidentes o tamanho máximo que podemos alcançar. Quando se suja as mãos e a alma para vencer a qualquer custo e mesmo assim se é superado.
Todas as capas de revistas foram impressas, todos os boatos foram espalhados, todo o ódio proferido. Deus teve seu santo nome jurado em vão. A fé do nosso povo foi usada como elemento de chantagem política. Não havia nenhum obscurantista sequer que não estivesse do lado de lá. E mesmo assim a direita foi derrotada. Não há mais nada a temer!
A vitória é dos progressistas! Uma vitória encorajadora, talvez nunca antes ocorrida. Porque todos os conflitos estiveram à mesa. A imagem oficial da campanha era justamente a Dilma presa pela ditadura.
Uma vitória não só do povo brasileiro, mas também da América Latina. O Brasil, por sua importância, é o fator de equilíbrio neste continente historicamente oprimido e explorado, onde os processos políticos tendem a ser interdependentes.
O Brasil adiou e escondeu por muito tempo certos conflitos na nossa sociedade. Nos escondemos em mitos e fantasias como o da democracia racial e de que tudo sempre acabaria em samba. Agora, nós queremos mesmo é sambar, mas se tivermos que estabelecer um grande e exaustivo debate político sobre os rumos do Brasil, tudo bem, porque as lutas sociais sempre estiveram dentro da gente e fazem parte de nossas vidas.
sexta-feira, 24 de outubro de 2014
Obrigado, direita!
Obrigado, direita por mostrar tão nitidamente a sua face mais destrutiva e violenta.
Obrigado, direita por tornar visíveis os seus preconceitos e o desejo de restauração das velhas hierarquias.
Obrigado por deixar a olho nu o seu autoritarismo. Por mostrar o seu desprezo pelas escolhas alheias. Por desconsiderar uma visão de mundo que não seja a de vocês.
Obrigado por nos xingar de desinformados, ignorantes, acomodados, preguiçosos, corruptos. Obrigado por não nos acolher e nos deixar de fora deste camarote VIP eleitoral onde só entra quem se supõe mais esclarecido e iluminado que os outros.
Senhores reacionários, agradeço por defenderem tão explicitamente a ditadura militar e a tortura. Ficou muito mais fácil para identificar o real projeto político de vocês e encorajou muito mais as nossas escolhas.
Damos graças aos eleitores conservadores que despejam ódio nos fóruns de internet. Vocês explicitaram tudo aquilo que fica oculto numa candidatura oficial e escancararam os desejos mais inconfessáveis.
Agradecemos até mesmo as perseguições. Os ataques de fúria. As agressões físicas em praça pública aos companheiros que usavam camiseta vermelha. Foi bom que vocês fizeram isso antes da eleição. Pensando bem, até que vocês foram honestos. Normalmente as candidaturas nos afagam e depois do pleito nos enchem de porrada. Vocês não! Já nos dão mostras grátis do tamanho da opressão que iríamos sofrer. Prometem justamente o que iriam cumprir.
Obrigado direita pela Guerra Fria requentada. Por mostrar como vocês estão atrasados. Que não superaram nem o fim da escravidão, que dirá a ameaça de "golpe comunista". Obrigado por defender tão ardorosamente o neoliberalismo. Ficou mais fácil perceber qual seria o nosso futuro olhando para as grandes economias, agora decadentes, sem potencial econômico e sem vitalidade social.
Obrigado por criticarem tanto os programas sociais. Ficou fácil perceber o egoísmo e indiferença de vocês frente à fome e a miséria.
Direitona, obrigado por revelarem ao grande público estes humoristas yuppies tão ruins. Que reivindicam o direito de fazer piada sobre qualquer barbaridade, violência e exploração. Por serem emissários, através de suas "piadas", do preconceito e do servilismo de vocês. Por não deixarem oculto o desejo de reestabelecer os velhos privilégios e colocar novamente os negros, as mulheres, os gays e os pobres em seu "devido lugar".
Obrigado por resgatarem alguns antigos "astros do rock". O problema é que eles ressurgiram meio carcomidos e caquéticos. Fazendo Cover de si mesmos. Muito bobos e imaturos, mas foi legal perceber como a mídia pode colocar as pessoas no esquecimento ou dar uma canja final, desde que os palhaços estejam dispostos a servir o rei.
Obrigado, direita pelas machetes, noticias e capas escandalosas. Por não deixar nenhuma dúvida que não há nada na velha imprensa que não seja entreguismo e interesses corporativos.
Aliás, obrigado por divulgarem em capa aquela foto da Dilma presa, encaminhada para a tortura nos porões da ditadura. Eu sei que a intenção de vocês era escandalizar a sociedade e causar pânico. Mas vocês humanizaram ainda mais a figura da presidenta. Mostraram ao grande público uma Dilma jovem, corajosa e combativa, que inspira milhões de pessoas que não se conformam diante da injustiça. Agora, aquela imagem ficou eternizada e se tornou uma grande bandeira.
Por tudo isso que foi dito, agradecemos muito a direita!
Seremos eternamente gratos por não nos roubar ilusões e fazer com que a gente entenda de uma vez por todas que não se pode confiar em vocês nem um tantinho assim, nada!
Porque nunca estivemos tão unidos e tão fortes. Porque a truculência de vocês nos mobilizou e nos fez agir.
Vocês aproximaram todos aqueles que não fecham com este discurso violento, rancoroso, preconceituoso, homofóbico e cruel.
Nos unimos num fraterno abraço. Um abraço tão gostoso que promete durar décadas.
Dessa vez, o crédito pela vitória não será de nenhuma aliança espúria com vocês. Pois vocês tiveram que arrancar a máscara, sujar a mão de graxa para no final das contas engolir mais uma derrota.
Obrigado, pois dessa vez a vitória será toda nossa!
quinta-feira, 23 de outubro de 2014
E os Pleiba?
E os pleiba que acordam com sucrilhos no prato? A vida toda acertada, cheios de proteção e vem falar de meritocracia? Tratar como iguais justamente quem teve vidas terrivelmente diferentes?
E os pleiba que tem instinto? Os pleiba que desde moleque desenvolve a arte do bullying? Que, todo corajoso, dão porrada nos gordinho, nos viadinho, nas mina que tem sarda, no baixinho, no negro, nos caras que estudam de verdade?
E os pleiba que aceleram o carro na poça d'água e molham os carinhas no ponto de ônibus? Vestidos para o trampo com terno, roupinha bem passada, maquiagem, envelope com documento? Os pleiba riem satisfeitos... E os pleiba que estragaram a vida do moleque que se aprumou para a primeira entrevista de emprego?
E os pleiba que passam com a moto acelerada fazendo barulho irritante, enquanto a gente troca uma ideia da hora na mesa do bar?
E os pleiba que no meio da balada segura os cabelo das mina? Pega pelo braço, se sente o gostosão e quando se dá conta que foi rejeitado, fala uma pá de merda no ouvido da menina?
E os pleiba que fazem "rodeio de gorda" no meio da faculdade? Sabia dessa?
Aqueles que esboçam um sorriso no canto da boca e fazem acreditar que podem ser minimamente humanos durante dois segundos e meio, para depois zoar a mina que deu um sorriso firmeza para ele?
E os pleiba homofóbico? Aqueles que param os gays no meio da rua pra encher de porrada?
E os pleiba que não sai da academia pra depois dar uma de valente? Fica arrumando treta de graça com a galera?
E os pleiba que se fazem de machão pro papai, bate nos viado, mas quando muda de cidade, rapidinho solta as franga reaça?
E os pleiba racista? Que nunca pegou na porra de um livro na vida, mas reclama da lei de cotas que colocou o moleque negro que estudou pra cacete na mesma sala de aula que ele?
E os pleiba que vive na farinha? No gran circuito da sociedade pagando de gatão.
E os pleiba que vivem fazendo proselitismo neoliberal, explicando como o mundo pode ser perfeito com a tal livre iniciativa e a autoregulaçãl do Mercado que pode ajudar automaticamente os mais pobres. Sei...
E os pleiba que não conseguem trocar uma ideia séria? Que te dá uma risadinha no canto da boca e te trata igual otário?
E os pleiba que nunca fizeram nada de útil na vida e vem tratar os desfavorecidos como vagabundos?
E os pleiba que tratam seus empregados como lixo?
E os pleiba que cola gritando "Sabe com quem você está falando?".
Se liga, Pleiba...
Nem cola, seu trouxa.
Tira a mão de mim, cuzão!
Vaza otário!
Você acha que o seu papinho agora me convence?
Perdeu, playboy!
quarta-feira, 22 de outubro de 2014
Ensaio sobre o Tesão Ideológico
ENSAIO SOBRE O TESÃO IDEOLÓGICO
Fiquem tranqüilos. Nada causará a extinção do tesão meramente carnal. Aquele de cabeça vazia. Com o coração e o espírito livres.
O desejo alienado e físico, desprovido de moral, felizmente sobreviverá por milênios.
Porém, o que tem mudado sensivelmente de uns tempos para cá são os caminhos pelos quais as pessoas se aproximam.
O encontro não depende mais da geografia, da família, do espaço ou da comunidade.
São os interesses compartilhados que põem frente à frente os potenciais amores. Sejam estes amores de amigos ou amores de amantes.
E neste universo em que o gosto, a predileção, a opinião e a estética são fatores de aproximação de pessoas que outrora estariam distantes, como encantar-se por quem parece contrariar justamente o que nos aproxima?
A visão de mundo, o comportamento, as escolhas e as decisões, tornam-se hoje tão ou mais importantes do que a roupa que se usa.
Tentarei ser um pouco mais claro.
Será que os opostos ainda se atraem?
Será que os progressistas ainda se encantam pelas conservadoras, ou vice-versa? E a bicho-grilo se enamora pelo coxinha? A esquerdopata se apaixona pela reaça. O alternativo se interessa pela homofóbica? A comuna daria bola para o fascistinha?
Em 2014, a Mônica ainda teria a mesma paciência com o Eduardo?
Na cidade grande, onde as pessoas surfam em diversos circuitos e tribos, com um cardápio muito maior de opções e sem depender de um único núcleo de convívio social, tem muita gente sustentando que seu tesão é mesmo ideológico.
E isso não é ruim. Na verdade, pode ser muito bom.
Quando se compartilha das mesmas ideias, vive-se algo grandioso que é o companheirismo.
O companheirismo coloca as partes em condição de cumplicidade.
A cumplicidade é uma delicia. É a chave que abre as portas para a intimidade.
E a intimidade abre as portas para toda sorte de desejos.
Já o desejo abre as portas, abre as pernas, abre o jogo e o coração para tudo aquilo que a vida ofereceu de mais gostoso.
Quem assume certos ideais, inevitavelmente causa algum nível de conflito, rejeição e resistência. É muito mais fácil não se posicionar e passar a vida toda se equilibrando, tentando perder o mínimo possível e se fazendo de invisível.
Logo, quando as pessoas encontram alguém que está na mesma trincheira, estabelecem uma relação de camaradagem. É possível que se crie um fluxo de consideração, respeito, admiração, desejo, tesão e também grandes sentimentos de amor.
E o bom amor tem que ser livre.
A liberdade é o terreno mais fértil para o desejo.
A sacanagem não está na direita nem na esquerda. Nenhuma corrente política detém o monopólio do tesão.
Porém, os moralistas, rígidos e inquisidores não parecem ser afeitos à certas bruxarias e picardias.
Se de cara o cão raivoso exclama que "o aparelho excretor não reproduz", que tratamento especial se imagina que ele pode oferecer a outras partes do corpo que não caminham para o útero? A boca, a mão, os dedos, as costas, o pescoço, os ouvidos, as coxas, a virilha, os seios. Há tanto a ser degustado, além do próprio aparelho excretor. Mas o moralista conservador não promete nada além de um beijo na testa na mãe de seus filhos.
Claro que o Pierrô está sempre chorando. Enquanto ele promete a ordem e um bem-estar asfixiante à Colombina, o Arlequim lhe presenteia com uma boa fungada no cangote e ela responde: "venha cá meu nego!".
Quem deseja ir à cama com uma pessoa cheia de regras, mitos e preconceitos?
A cama é território da liberdade. Dos libertinos e também dos libertários.
Certa vez, o Freud disse que a perversão é, aos olhos de quem a vê, uma ameaça de felicidade.
A liberdade é ameaçadora, pois ela põe em risco os poderes estabelecidos. A felicidade é subversiva.
Há algo muito além da política e da economia que ameaça aqueles que cultuam o ódio.
Qualquer sintoma de convivência pode significar um risco de igualdade.
Por isso é preciso interromper as festas com a lei do silêncio, com jatos d'água, com viaturas da polícia. Pois as pessoas estão transando por aí.
E o pior. Suas mulheres estão sendo roubadas. Suas filhas desencaminhadas. Os homens estão sendo obrigados a aprender "truques" novos para atrair as "suas" fêmeas, quando antes bastava apenas o seu gosto.
Mas as festas não irão acabar. As pessoas irão se encontrar. E vai tocar aquela canção que diz assim: "Você não gosta de mim, mas sua filha gosta".
segunda-feira, 20 de outubro de 2014
Truculência da Direita Mobiliza os Setores Progressistas
Muita gente que defendia o voto nulo ou que fez oposição à esquerda ao atual governo, está manifestando seu apoio e lutando para a reeleição da Dilma.
O que unifica e mobiliza os setores progressistas é justamente a truculência e a cultura escravocrata da direita brasileira.
Um exemplo é aquela questão do "rolezinho" que ocorreu ano passado. Não podíamos sequer fazer uma crítica ao consumismo, à despolitização, à falta de educação, à alienação e ao fetiche da mercadoria. Tínhamos que antes de tudo defender o básico, ou seja, o acesso da população pobre e negra nos espaços de convivência pública.
A direita brasileira é o atraso. O que surge como "mudança" é o que há de mais velho e apodrecido. O que os direitosos querem é a restauração das velhas hierarquias. É a "re-subordinazação" dos pobres através da dependência econômica. Por isso eles odeiam tanto os programas sociais.
Não podemos avançar com um projeto de desenvolvimento nacional com distribuição de renda e inclusão social porque ainda estamos fechando as contas com o fim da escravidão e com a Guerra Fria.
Estamos impedidos de falar do Brasil do século XXI porque alguns setores ainda querem restaurar a República Velha.
Embora a redemocratização do Brasil tenha sido um sucesso em todos os níveis (social, político e econômico), do outro lado tem gente defendendo a Ditadura Militar.
E assim seguimos... com nossas contradições. Tentando falar nos direitos humanos em todos os níveis de igualdade e tendo como opositores justamente os setores religiosos mais histéricos.
Buscando sensibilizar sobre o valor da caridade e da justiça social e causando moléstia justamente nas "pessoas de bem".
Reduzindo a mortalidade infantil e ampliando o acesso à saúde e causando fúria justamente nos médicos.
Tirando o Brasil do mapa da fome, uma das maiores conquistas humanas da história do país, e os filhos da subnutrição sendo chamados de acomodados. Ora, o comodismo não seria justamente se conformar com a fome e a desgraça dos nossos irmãos brasileiros?
O que a direita não consegue entender é que não estamos aqui só para "defender a Dilma". Defendemos sim, as conquistas dos últimos anos e apoiamos a sua candidatura. Mas isso não é um fim em si mesmo. Para além de tudo isso, temos que lutar muito para superar o atraso, a covardia, a truculência, o preconceito e a violência da direita brasileira.
quinta-feira, 16 de outubro de 2014
A vida urbana e as eleições presidenciais.
A vida urbana e as eleições presidenciais.
Pouco se fala sobre impacto da qualidade de vida nas grandes cidades nas eleições nacionais. Ainda que estas questões não estejam diretamente ligadas à administração do Governo Federal, torna-se interessante perceber e medir seu peso político no quadro sucessório.
Temas como a precariedade na infraestrutura urbana, a insegurança, a insuficiência dos serviços públicos, trânsito caótico e o aumento considerável no custo de vida, interferem na satisfação dos brasileiros que vivem nos grandes centros urbanos.
O Governo Dilma tem catalisado a maior parte das insatisfações e assumido o ônus sobre problemas que vão além do cenário incerto na economia.
O mapa da apuração das eleições por município demonstra que enquanto o candidato Aécio Neves teve melhor desempenho nas grandes cidades, a Presidenta Dilma obteve melhores resultados nas pequenas.
Desde as eleições de 2006, nota-se que o PT vem perdendo espaço entre os eleitores das classes médias urbanas. Mesmo na Região Nordeste, onde Dilma acumulou vitórias expressivas, seu desempenho não manteve o mesmo nível nem algumas capitais.
Em São Paulo, mesmo com problemas como a insegurança hídrica, violência e deslocamento urbano, o Governador Alckmin venceu sem dificuldades, enquanto Dilma perdeu inclusive em tradicionais redutos do PT na Região Metropolitana.
O drama do deslocamento urbano deixou de ser uma questão grave apenas no eixo Rio-São Paulo. Hoje, as grandes cidades brasileiras padecem com congestionamentos monstruosos.
O Baixo nível de desemprego, talvez o melhor resultado da gestão de Dilma, revela a falta de capacidade das metrópoles em garantir o funcionamento sob alta demanda dos sistemas viários e dos transportes coletivos. São milhões de trabalhadores, saindo de casa todos os dias no vai e vem asfixiante.
O custo de vida nas cidades também aumentou sensivelmente. Para além das questões conjunturais da economia (que não são menos importantes), o aumento do mercado consumidor na última década, desencadeou uma sanha especulativa. Em resumo, muita gente resolveu ficar rica do dia para a noite. O preço dos imóveis saltou. Ao sair para jantar, o brasileiro se deparou com preços cada vez mais absurdos e extravagantes.
A inclusão social que alavancou as vitórias de Lula e Dilma, ironicamente pode ter causado certas pressões que influenciam o cotidiano nas grandes cidades. Ainda que tenhamos ampliado a quantidade de brasileiros na classe média, o Brasil se mantém como uma sociedade vertical, hierarquizada e baseada no prestígio pessoal.
Os brasileiros ainda tem na memória as rupturas econômicas, choques inesperados e privações. O desejo de consumo, represado durante anos, liberou uma espécie de energia consumista. As políticas econômicas de estímulo ao consumo do governo colocaram mais lenha na fogueira.
O consumismo, além de interferir diretamente na poupança dos brasileiros, na inadimplência, no endividamento e na alta dos preços, leva também a um inevitável desconsolo e insatisfaçãopessoal quando este ciclo é interrompido.
Outro dado que interfere na vida urbana é a violência. A sensação permanente de insegurança por conta da criminalidade é agravada pela falta de confiança nas polícias e descrença no sistema judiciário.
A desigualdade social já faz parte da vida mental dos brasileiros. A inclusão (ainda que insuficiente para equalizar injustiças históricas) de milhões de pessoas no mercado de consumo e por consequência na vida cotidiana das metrópoles, exerce uma pressão invisível para que os que já estavam estabelecidos também sejam premiados com a subida de mais alguns degraus na escala social, sob pena de se sentirem automaticamente mais pobres, quando na verdade estão mais iguais.
Durante o primeiro-turno, diferentes partidos tentaram se apropriar de um suposto “capital político” dos protestos do ano passado. Aparentemente, houve a supervalorização do potencial eleitoral deste acontecimento. Entre outras coisas, pela incompreensão do chamado “recado das ruas”.
Não houve um recado só. Tampouco uma só motivação. Porém é possível dizer que a “crise de felicidade” tem muito a ver com questões relacionadas a vida urbana nas grandes cidades.
Embora a classe política como um todo tenha sido alvo das manifestações, foi o Governo Federal quem ficou como maior depositário das soluções dos principais problemas, sejam eles federais, nacionais ou municipais. Virou tudo um bolo só.
Retrato de um "Corinthians" desalmado
terça-feira, 14 de outubro de 2014
A honradez de Xico Sá, censurado na Folha
Nícolas Chernavsky - "Eu quero um governo progressista para o Brasil"
Mais uma vez publico um artigo do meu amigo Nícolas Chernavsky.
Nicolas Chernavsky é analista político e produz o sítio culturapolitica.info, que analisa as eleições ao redor do mundo e a política global.
Eu quero um governo progressista para o Brasil! Vamos Dilma!
quinta-feira, 9 de outubro de 2014
A urna eletrônica não dará compaixão a quem não tem
quarta-feira, 8 de outubro de 2014
Próximo presidente estará no fio da navalha
segunda-feira, 6 de outubro de 2014
A Escalada do Conservadorismo e a Polarização entre Esquerda e Direita.
Muitos irão questionar se o PT ainda é efetivamente um partido de esquerda ou se os tucanos são uma força genuinamente direitista. Porém, com efeito podemos dizer que estas duas forças políticas foram capazes de capturar em nível nacional um conjunto de pensamentos, expectativas e ideologias que estão em crescente conflito.
Quando o PT se aproximou do centro, num esforço de construir uma hegemonia política em que estivesse no topo e garantisse as condições para a chamada governabilidade, abrigou diferentes forças políticas que estavam órfãs, desde o processo de implementação da agenda neoliberal. Setores do nacional desenvolvimentismo brasileiro, incluindo forças reconhecidamente conservadoras, foram acolhidos no que ficou conhecido como lulismo.
Não são poucos os que criticam as alianças construídas pelo PT e sua operação política desde que subiu a rampa do Planalto. Algumas correntes de esquerda discutem severamente a aliança com alguns setores da burguesia nacional, inclusive a efetividade dos resultados desta coalizão de forças.
Ocorre que na política, muitas vezes as forças se acomodam onde encontram melhores espaços. Se estabelecem no terreno que parece ser mais fértil e que apresenta melhores condições. No espaço mais receptivo e com clima menos hostil.
Do mesmo modo, o PSDB foi empurrado para uma direita ideológica e intransigente. Ainda que os tucanos não sejam genuinamente uma força de direita, encontrou espaço e atalhos abrigando e sendo abrigado pelas correntes conservadoras.
A tentativa do PT de disputar espaço em setores da burguesia nacional pode ser considerada em parte frustrada. Se durante algum momento, Lula conseguiu costurar uma trégua para realizar importantes (e as possíveis) reformas sociais, esta não se mostrou uma aliança duradoura. Para a elite, a intercorrente relação com o PT é meramente funcional. Ainda que o setor produtivo tenha sido o mais beneficiado com a restauração da atividade econômica, parece não existir aderência destes setores para uma aliança com o atual governo. Ainda que seja em prejuízo de seus próprios interesses, hegemonicamente as elites jogam pesado para interromper o ciclo do PT no poder nacional.
É claro que estes setores da burguesia, como sempre fizeram, irão mobilizar as forças do Estado em favor de seus interesses. Seja com Dilma ou com Aécio. Porém, a cartilha rezada pelo PSDB prevê uma ortodoxia econômica que deve favorecer predominantemente o mercado financeiro. O corte de gastos públicos, investimento do Estado, o arroxo fiscal e o controle da inflação a partir da queda da atividade econômica, certamente provocará perdas em diferentes setores produtivos da economia.
Não é novidade que a nossa elite nacional é incapaz de se mobilizar em torno da construção de um projeto de desenvolvimento para o Brasil. Desde que eles continuem como ricos senhores e detentores de todos os privilégios sociais, pouco importa a decadência do país. Debaixo do sol não há nada novo.
O prestígio e os privilégios sedimentam a polarização entre conservadores e progressistas, não apenas entre PT e PSDB.
Muito mais do que questões como a corrupção, o crescimento econômico, a infraestrutura nacional, o que está em jogo é o desejo de restauração das velhas hierarquias. As transformações sociais causam ruídos, tormentos e transtornos. Muitos sentem-se inseguros. Nossa sociedade é vertical. A hierarquia social já faz parte da vida mental dos brasileiros. Muitos anseiam para que ocorra logo a acomodação das classes para que se saiba logo a quem servir o por quem deve ser servido.
E não se trata apenas de classes sociais e economia. Não foi só isso que mudou nos últimos anos. A nostalgia das velhas hierarquias está diretamente ligada ao culto do politicamente incorreto. Estão em jogo também questões ligadas aos direitos humanos como o combate à homofobia, a emancipação das mulheres, as políticas afirmativas para os negros, a ocupação social dos espaços públicos.
Alguns podem supor que no fundo os dois partidos representem o mesmo projeto, mas na prática não é assim que a banda toca.
Para vencer a eleição, o PT deve reafirmar sua aliança com os setores mais pobres e desfavorecidos da nossa sociedade. Defender a proteção das minorias perseguidas pelas maiorias. E não se trata de minoria em termos populacionais, mas daqueles que são sub-representados nas instituições.
Do mesmo modo, a vitória da direita autoriza e prestigia os setores mais conservadores e intransigentes.
Nos últimos anos, a direita raivosa tem sido o fator de mobilização e aglutinamento dos progressistas.
Para quem acompanha a história política recente, uma frase usada na campanha de eleição de Bill Clinton em 1992 por seu estrategista James Carville, se tornou um jargão conhecido e uma tese defendida por muitos. Para encontrar o ponto principal para vencer George Bush (pai), ele exclamou: “É a economia, estúpido!”.
No Brasil de 2014, podemos dizer que Não é a Economia, estúpido.
Ainda que o cenário econômico esteja repleto de incertezas, ele não é mais problemático do que em nenhum momento da história recente do Brasil. Embora o crescimento seja pequeno, não há nada que esteja em descontrole. O nível de emprego é um dos melhores de nossa história.
A questão da corrupção é repetida exaustivamente, mas ela é só a fachada para manifestar sentimentos inconfessáveis. O PT não inaugurou a corrupção no Brasil. Governos de todos os partidos recebem denúncias preocupantes, inclusive com escândalos nos governos tucanos em São Paulo e em Minas Gerais. Mas o que se vê é uma espécie de indignação seletiva.
Às velhas forças tradicionais ou por quem já está na ponta de cima da pirâmide, a corrupção parece ser mais tolerada. O que incomoda mesmo é a subversão hierárquica. É quem se sente subvertido pela “corja sindical” que dirige o país.
Outras questões que não estão ligadas diretamente à condução econômica são mais relevantes neste pleito. O caos urbano nas grandes cidades, o desgaste dos doze anos do PT no governo, os gargalos na infraestrutura nacional, a qualidade dos serviços públicos como saúde e educação, a percepção de felicidade, consumismo, o endividamento. Todos estes pontos merecem uma análise mais aprofundada.
No entanto, não existe nenhuma experiência administrativa do partido de oposição, nem em sua última passagem pelo Planalto, nem nos estados dirigidos pelos tucanos, que faça crer que receberíamos resultados melhores mudando o governo.
Não faltam motivos razoáveis para realizar críticas sérias aos últimos governos do PT. No entanto, o que se vê, são manifestações de repúdio pelo que ele fez de melhor, não de pior.
A escalada do conservadorismo ficou nítida no resultado das eleições parlamentares. Se antes para conquistar o voto do lumpen conservador era necessário prometer obras faraônicas inexequíveis, hoje a promessa passa a ser a restauração dos “valores”. É a “bolsonarização” da política. Gerou-se também uma escalada de intolerância, não somente no ambiente político, mas na vida social dos brasileiros.
A discussão não é mais somente sobre o papel do Estado como regulador das relações econômicas e na redistribuição das riquezas. A direita não se limita apenas a defender o livre mercado, um Estado menos intervencionista e a predominância da iniciativa privada. Para os conservadores, existe um “inimigo social” invisível. O que mobiliza corações e mentes conservadoras é a restauração das velhas hierarquias e privilégios.
As recentes transformações sociais, ainda que insuficientes para sanar as grandes injustiças históricas, provocaram arrepios e escândalo em quem estava acostumado a desfrutar uma posição de privilégio. Hoje, certos posicionamentos não podem mais se manter ocultos. Se antes um racista se escondia atrás do mito da democracia racial no Brasil, hoje ele não mais tolera ser coagido a controlar os seus impulsos preconceituosos. Quando os gays permaneciam escondidos e não ambicionavam gozar de igualdade de direitos civis, eles eram mais “tolerados”, porém quando eles “ousaram” ocupar os espaços públicos que pertenciam aos “pais de família”, donos das “casas grandes” espalhadas pelo Brasil, passou a existir choque e destempero. Quando os “formadores do opinião” decidiam as eleições, fingia-se a satisfação com a democracia representativa. Com a insubordinação dos pobres, nem a grande mídia controla mais o processo. A democracia se tornou um inconveniente. Pipocam nas redes sociais defesas da ditadura militar e da tortura. Quando a mulher apanhava e aceitava de bom grado as pancadas, a família estava em “primeiro lugar”, já a Lei Maria da Penha ameaça subverter o poder do chefe patriarcal.
A mobilidade social, primeiramente gera um sentimento de euforia. Logo depois, ocasiona um desejo de preservação do status adquirido. A mesma classe média que foi gerada nos governos de Getúlio Vargas, em parte apoiou o golpe militar em 1964. A “nova classe C” é potencialmente conservadora e reacionária. Sua inserção social se deu via consumo. O número de evangélicos é majoritário. A memória de pobreza gera arrepios e precisa ser apagada, nem que seja através de uma aliança com os mais ricos.
Não que existam mais conservadores do que antes. Ocorre que eles foram obrigados a “sair do armário”. Eles sempre estiveram aqui. Os progressistas sim, estiveram por muito tempo desnecessariamente espalhados.
A polarização e o conflito de forças podem causar temores. Mas, talvez, tenhamos perdido um imenso tempo histórico em conciliações mentirosas.
A escalada do conservadorismo se reflete também numa escalada da intolerância. Devemos sim perseguir a paz e o bem comum, mas que isso não dependa da submissão, do conformismo, do cabresto e do retrocesso.
O respeito deve mútuo. Todos devem entender que também podem ser contrariados. Não seremos uma sociedade melhor com uma trégua social alcançada pela força, com opressores e submissos.