quinta-feira, 1 de maio de 2014

O Brasil do Ayrton Senna



Quem tem mais ou menos a minha idade não aceita que falem um A do Ayrton Senna.

Era verdadeiramente o ídolo da molecada.

Alguém que se queria ser. Que não decepcionava. Que não vacilava.

Durante os anos em que o Ayrton brilhou, o futebol brasileiro andava meio mal das pernas. Depois da derrota trágica na copa de 1982 e tentativa fracassada de restauração em 1986, o futebol teve uma significativa queda. Tentávamos encontrar um novo caminho que explicasse nossos fracassos incorporando algumas técnicas dos europeus. Deu no que deu e chegamos à Geração Dunga".
Foi nessa época também que o vôlei se alastrou e se popularizou. Hortência e Paula também brilhavam no basquete. Nosso futebol é que não andava bem.

O Ayrton Senna nos redimia. Nos fazia vencer.

O processo de redemocratização do Brasil caminhou à duras penas.
Lutamos, superamos duas décadas de ditadura. Tancredo Neves, o primeiro presidente civil eleito pelo congresso morreu sem poder assumir. Mergulhamos no governo do Sarney tendo de lidar - sem legitimidade - com demandas históricas. Nossos problemas foram agravados e mergulhamos numa crise de hiper-inflação. O primeiro presidente eleito em eleições diretas depois de três décadas foi o Collor. Todo mundo sem dinheiro no bolso, sem emprego, sem empresa. Uma tristeza.

Mas por que eu falo tudo isso?

Por que o Senna nos reparava. Ele era o Brasil que nós sabíamos que poderíamos ser. Um país vencedor.

Enfrentava sem medo os adversários gringos. Sem reverência. Sem babação de ovo, como vemos desde sempre.

Vejo algumas reportagens em que alguns ressentidos questionavam os "métodos" de Ayrton e se ele era realmente uma pessoa "simples".

Verdadeiramente, o Ayrton Senna não era o que se chama hoje de "coxinha". Não tinha o discursinho para agradar a imprensa e cativar alguns possíveis anunciantes. Nem através de desculpas esfarrapadas para cada derrota. O Senna enfrentava a tudo e a todos sem medir consequências.

Ayrton Senna não era um "carreirista". Não tomava a decisão mais fácil e com menor nível de confronto para garantir o seu lugar ao sol. Ele jogava duríssimo com os empresários e donos de equipe. Negociava grandes contratos e exigia o melhor para que pudesse vencer.

Com seus adversário também era implacável. Protegia como ninguém os seus interesses.

Ora, não é assim que todos jogam com o Brasil ou no mundo dos negócios para além das questões esportivas?

Quanto a questão da tal "simplicidade", para a imprensa (território absoluto da arrogância), ser simples é cair de joelhos cada vez que surjam os flashes ou as câmeras. E, principalmente, que não seja um vencedor. Para eles, o sucesso é uma agressão.

Os ídolos do esporte, de uma maneira geral, são impedidos de se posicionar com seriedade. São colocados na prateleira das personalidades folclóricas, chamados sempre para alguma entrevista engraçadinha. Mesmo o Pelé, o maior de todos os tempos, que tem certa dificuldade com o domínio do discurso, é explorado sempre com frases publicadas fora do contexto, carregadas de jocosidade.

Querer hoje transformar o Ayrton Senna num santo é deturpar suas reais qualidades.

O Senna não era um líder espiritual. Era um vencedor. E para vencer, muitas vezes temos que contrariar interesses poderosos, enfrentar situações difíceis, acreditar nas nossas principais potencialidades, fazer melhor, apostar no nosso talento, deixar de nos enxergarmos como inferiores.

Era muito bacana ouvir o Galvão Bueno gritar ao final da corrida: "Ayrton Senna do Brasil".
Mas e o Brasil de Ayrton Senna? 

O Brasil precisa de bons recursos para vencer. Neste caso, não falo de um bom carro, uma boa equipe, uma chance para brilhar. Precisamos estar preparados com boas escolas e universidades, bem cuidados com hospitais decentes, proteger os nossos interesses como nação, porque de resto, talento nós já temos de sobra.

Mas tudo isso só será possível se deixarmos os complexos de lado e acreditarmos mais em quem somos. Somos um "da Silva", como o Ayrton e outros tantos. E daí?

Precisamos acreditar mais nas nossas potencialidades e também, como consequência, sermos mais arrojados, tomarmos decisões difíceis, fazermos grandes manobras e assumir também certos riscos.

Um pouco de sorte não faria mal a ninguém.

PS: não falei do Ayrton dentro das pistas porque há material visual suficiente disponível para provar que ele foi o maior piloto de todos os tempos. Um talento absurdo. Corria com raça. Um espetáculo acima do normal.

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