quarta-feira, 6 de março de 2013

Chorão foi um grande artista do seu tempo






O Chorão não tinha a mesma bagagem e o leque de influênciasda grande leva de roqueiros nos anos 80, como Legião, Paralamas, Titãs, Ira,Peble Rude, Ultrage, Barão Vermelho, entre outros nomes que beberam diretamentena fonte dos grandes arquitetos da Música Popular Brasileira.

Até porque o momento histórico em que foi inserido na cena musical era totalmente diferente, sendo injusta e desnecessária qualquer comparação com estes grandes nomes da música brasileira que fizeram história.

Certa vez, tentava explicar para um amigo colombiano que recentementese mudara para o Brasil, o porquê da imensa importância do Rock para a nossageração.

Os jovens que nasceram ao final dos anos 70 ou no começo dos anos 80 são todos “meio roqueiros”. A formação musical e cultural dessa galera é absolutamente embriagada pelo Rock Brasileiro. Quem tem mais ou menos trinta anos nutriu devoção e admiração pelas grandes bandas tendo, inevitavelmente, um grupo especial de sua preferência.

No meu esforço de explicação, argumentei que o Rock para anossa geração era muito mais do que um estilo musical, mas um movimentocultural.

Durante o período do regime militar, as grandes aglomeraçõesde jovens eram inevitavelmente vistas como ameaçadoras ao regime.

O período de redemocratização do Brasil convergiu com agrande explosão do Rock Brasileiro.

O primeiro Rock in Rio, por exemplo, ocorreu no mesmo momento em que Tancredo Neves era eleito presidente pelo colégio eleitoral, marcando o fim do Regime Militar.

O Rock talvez não fosse uma novidade, mas a oportunidade de expressão e aglomeração era uma boa nova para a juventude que podia agora se posicionar frente às grandes questões nacionais e também sobre os dilemas comportamentais.

Se a geração dos anos 80 estava entorpecida pelas grandes preocupações estruturais de seu tempo, com ferozes críticas às nossas instituições,a geração do Charlie Brown Jr. tinha uma pegada diferente.

No caso do Chorão, os conflitos existenciais do jovem ocupavam grande espaço na sua obra.

Era latente o trauma do individuo que se tornava adulto e era obrigado a se relacionar com a ética, a moral e o conjunto de normas da sociedade, quando dispunha apenas da ética privada de seus círculos sociais.

Chorão era o jovem descolado das instituições que historicamente orientaram o comportamento dos indivíduos. Não se reconhecia na escola, na família, nem na igreja. Dispunha de poucos recursos. Não estava disposto a se enquadrar nas demandas dos anos 90, que exigia dos indivíduos a absoluta rendição e devoção aos novos valores da globalização.

Seu escritório era na praia. Ele era o jovem que recusava a domesticar-se,vestir-se como um almofadinha, arrumar um emprego descente e servir a umacorporação para ser alguém na vida. Pra socialite ele não tinha vocação, comodisse em uma de suas canções.

Daí o seu grande potencial de comunicação com a juventude.

Nem todos estão dispostos a “fazer tudo direitinho” para talvez um dia serem agraciados com alguma promoção.

Esta é uma falha endêmica deste sistema. A maioria das pessoas pode até não contestar o modelo, mas tampouco está disposta a servi-lo caninamente.

As pessoas maximizam seus interesses pessoais, aproveitam de uma ou outra eventual garantia social, mas tocam suas vidas da maneira mais conveniente possível.

Chorão foi um dos grandes artistas de seu tempo.

Seus críticos percebem com rapidez que as grandes questões estruturais “passaram batido” na sua obra.

Mas o compositor é um bom retrato do flagelo desta geração. Todas as fórmulas estão prontas. Um “outro mundo” não está disponívelno momento. Não há nada por que se possa lutar. A realização material é um consolo para as satisfações cada vez mais instantâneas.

Quem não se identifica, torna-se automaticamente um impertinente. Sofre porque sente que não tem lugar no mundo.

Chorão era honesto com ele mesmo e perplexo com a própria existência.

No fundo, o Chorão era um romântico. Queria mesmo viver (e morrer) de amor.

Ainda que não fosse aceito pelo pai da namorada, porque não era bom pra filha dele.

Ainda que tivesse um cabelo engraçado.

Ele falava tudo o que a galera gostava de escutar.

E fez o rock de um jeito que ninguém mais vai esquecer.











  

4 comentários:

  1. Olha! Uma surpresa a morte dele!
    Um cara tão emblemático...fará falta!
    Rafael , estou mudando para o word press, se puder vai lá conferir!
    http://olharesedetalhes.wordpress.com/
    Um abraço

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  2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. Ainda bem que vivi pra ouvir o Chorão, e ler você!
    Valeu, Rafa!!! (se é que me permite te chamar assim...)

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