quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Dez anos sem Cassia Eller

Há dez anos morria Cássia Eller.
Prato cheio para a imprensa marrom. A revista Veja com sua sanha moralista colocou uma foto de Cássia para alertar a população sobre o perigo das drogas. Depois se descobriu que ela não havia morrido por overdose como decretara a revista.
Anos antes a revista havia feito o mesmo com Cazuza que chegou a cantar “te chamam de ladrão, de bicha, maconheiro. Transformam o país inteiro num puteiro, pois assim se ganha mais dinheiro!”
Mas não era a eventual relação de Cássia Eller com as drogas que apavorava os conservadores. Era a sua irreverência.

A Cássia foi uma das poucas vozes dissonantes na babaquice geral que se tornou a década de 90.
Os anos 90 são o efeito mais bizarro da queda do Muro de Berlim.
A partir de então só existiria um modo de vida possível. Era o fim da história, como chegou a proclamar um economista yuppie.
As pessoas deveriam dar graças ao deus do capital e buscarem dentro de si ferramentas de auto-ajuda para se adequarem à nova realidade. Era necessário exorcizar os próprios fantasmas interiores, sem eleger um inimigo político como causador dos incômodos da vida cotidiana.
Foi a década dos livros de auto-ajuda.
Homens e mulheres deveriam ser eficientes, perseverantes, bem-sucedidos e adequados.
Os anos 90 são a década do “tá dominado, tá tudo dominado!”
E estava mesmo. Tudo dominado!
As meninas deveriam ser iguais à Adriane Galisteu e os rapazes iguais ao Luciano Huck.
Todos deveriam aparentar um sucesso desejável para a capa da revista “Caras”. Onde na verdade só apareciam "Bundas”.
Neste universo hostil e degradante, a atitude e irreverência de Cássia Eller era oxigênio para os nossos pulmões.
Mostrar a língua, mostrar os seios, masturbar-se no palco. Agredir aquela sociedade mentirosa e moralista era necessário.
Cantar de uma maneira que as meninas não deveriam cantar era mais do que um espanto. Era uma agressão.
Colorir os cabelos, comportar-se como uma roqueira, mas ao mesmo tempo cantar os sambas antigos com uma doçura inigualável confundia os almofadinhas que preferiam dançar a “dança da bundinha”.

Pois foi essa a obra de Cássia.
Mais do que uma das mais talentosas cantoras que já existiram neste país (se não a maior), foi a personalidade mais marcante e necessária de uma década triste e depressiva.
Cássia Eller se doou e se gastou em cada acorde e em cada gesto. Cumpriu sua missão brilhantemente.
Ficou pouco tempo na terra, mas ficará para sempre nos nossos corações.
Eu amo a Cássia Eller!



terça-feira, 20 de dezembro de 2011

O Legado de Andrés Sanchez




Andrés Sanchez cumpriu o seu mandato e está deixando esta semana a presidência do Corinthians.
Deveria ser uma notícia comum.

No entanto, o fato de um presidente de clube escolhido por meio de eleições diretas, ter cumprido o seu mandato e deixar seu cargo no prazo regimental, infelizmente, é uma exceção no futebol brasileiro.

A presidência de Andrés Sanchez foi a primeira gestão após uma década e meia da ditadura de Alberto Dualib.

A presidência de Dualib foi trágica para o Corinthians. Embora alguns argumentem que o time conquistou um número elevado de campeonatos durante este período, o mandato despótico de Dualib sufocou todas as instituições políticas do clube, cancelando as eleições e impedindo a participação da torcida corinthiana. O clube virou um balcão de negócios e os interesses econômicos do presidente prejudicaram a modernização e desenvolvimento do Corinthians. Neste período, o clube tinha dono. E nada é mais contrário à vocação corinthiana do que um clube privatizado.

Mas qual seria o grande legado da gestão de Andrés Sanchez como presidente do Corinthians?
Durante a presidência de Andrés, o Corinthians conquistou três títulos importantes. O Paulista e a Copa do Brasil em 2009, além do recente Campeonato Brasileiro de 2011.

A contratação de Ronaldo foi fundamental para o sucesso do projeto. As últimas equipes da “era Dualib” eram compostas por uma maioria de jogadores cafajestes totalmente desconectados das tradições corinthianas. O desrespeito à história e a representação do clube era visível. Alguns eram contratados e saudavam a “Sociedade Esportiva Corinthians” ou o “Corinthians Futebol Clube”. Terrível!

Não era pra menos. Se a própria diretoria do clube não respeitava suas instituições e se configuravam como uma confraria de malfeitores, não seriam os jogadores que valorizariam nossas tradições.

Mas o fato de um dos maiores jogadores da história do futebol mundial escolher o Corinthians para jogar, fazer sucesso e principalmente ganhar dinheiro abriu os olhos de outros jogadores mais incautos. O sucesso do projeto Ronaldo revelou a imbecilidade de outros jogadores de meia tigela que viraram as costas para o clube em nome de uns trocadinhos a mais.

A construção do Centro de Treinamentos, suporte fundamental para a infra-estrutura do futebol, também merece destaque.

A construção do estádio por si só seria motivo de glória para qualquer gestão na história do Corinthians, já que este tema atravessou mais de meio século no cotidiano do clube. Mas a viabilização de Itaquera tem um significado muito mais que especial.

O Corinthians caminha para a modernidade, mas fincado nas suas raízes históricas. Bem no meio da “corinthianada”. Sendo fertilizado pelo solo sagrado da zona leste paulistana.

Mas nenhuma conquista material ou esportiva pode se comparar com a recuperação institucional do clube.
O novo estatuto é a maior obra de Andrés.

Era muito triste ver o Parque São Jorge desabitado e entregue à obscuridade. Andar nas alamedas do clube era tarefa indigesta, já que o time do povo havia se transformado no quintal do Dualib.

O novo estatuto permite eleições transparentes. Temos chapa de situação e de oposição.

Minha posição quanto à gestão de Andrés sempre foi de um apoio crítico.

Não escondo que vou votar no candidato da situação.

Porém, não veria problema algum em ver a oposição vencer o pleito.

A eleição de uma chapa pela maioria dos associados não seria tragédia para ninguém, desde que seja garantida a alternância do cargo e o impedimento de reeleições subseqüentes. Esta é uma regra de ouro que jamais pode ser quebrada.

Havia prometido jamais votar no Andrés Sanchez caso ele modificasse o estatuto que ele mesmo ajudou a aprovar e viabilizasse um terceiro mandato.

Este seria um verdadeiro desastre para o Corinthians.

Logo, considero importante destacar a coerência do presidente em deixar o cargo e preservar as instituições do clube.

Não é difícil de supor, que depois das importantes conquistas do último período, Andrés Sanchez não teria dificuldades para se reeleger por mais um período. Mas esta prática abriria oportunidade para que qualquer outro aventureiro lançasse mão do mesmo expediente no futuro para se perpetuar no poder.

Andrés não é simpático para uma grande parcela da opinião pública. Demonstra impaciência nas entrevistas, comete erros grosseiros de português, provoca os adversários, expõe os seus vícios e não é nada polido.

Mas para o corinthiano ele entrará para a história como o presidente mais vitorioso e realizador, tudo isso sem deixar de resgatar as raízes históricas do corinthianismo.

O Corinthians agora se destaca como a maior arrecadação dos clubes da América do Sul e está pronto para grandes desafios globais, porém, sem abrir mão da sua identidade.

Andrés foi para a CBF.

Sua estratégia é se viabilizar como uma alternativa conservadora para uma eventual e talvez inevitável saída de Ricardo Teixeira.

Não duvido que ele seja bem sucedido.

Andrés tem virtude política, algo decisivo e necessário para quem deseja exercer o poder.

E nenhum diploma poderia garantir esta habilidade muito particular.

domingo, 4 de dezembro de 2011

Doutor Sócrates. Ficam seus lances e suas idéias.



O jogador de futebol deve estar relegado a um lugar social de submissão. Ele está condenado, para sempre, a ser um personagem folclórico. Esta forma de preconceito manifesta o desejo de reproduzir para a sociedade uma hierarquia mais ampla que permearia todas as esferas da vida social.
Embora os grandes futebolistas tenham uma importância destacada na nossa sociedade, cada vez que um atleta se arrisca em expressar sua opinião sobre algum tema que supere as quatro linhas do gramado é prontamente desqualificado e muitas vezes punido pelos órgãos dirigentes do futebol.
Mesmo quando um jogador de futebol conclui sua carreira com sucesso, salvando raríssimas exceções, exige-se que ele volte a ocupar um lugar subalterno na sociedade. O ex-jogador é chamado apenas para entrevistas que relembram seus momentos de glória e é desejável que ele fale principalmente de seus episódios engraçados e pitorescos, reforçando sua imagem de ignorante e boçal.
Nem mesmo Pelé, maior jogador de todos os tempos, pode expressar tranquilamente seus pensamentos sem que seja prontamente desqualificado por um jornalista qualquer.
Boa parte destes atletas incorpora este papel desejável para a elite. Sequer se dá conta que é conveniente aos poderosos que ele enriqueça. O jogador mergulha num mundo de fantasias, contentando-se com a satisfação de seus projetos individuais e renunciando ao seu potencial de comunicação com a sociedade.
O jogador Sócrates, sempre rebelde, contrariou este “lugar” desejado para os ídolos da bola. O status de doutor não foi adquirido com um simples apelido nos campos de futebol. Poderia até ser, dada sua genialidade, mas Sócrates se fez doutor através de seu mérito e de sua capacidade como homem.
Ao contrário dos milionariozinhos ruins de bola de hoje em dia, absolutamente indiferentes com a vida nacional (sequer se importam com o sentimento da torcida), Sócrates foi o grande mentor da Democracia Corinthiana que não somente transformou as práticas administrativas e hierárquicas dentro do Corinthians, mas foi um movimento que difundiu seus valores, a partir do “time do povo”, para toda a sociedade brasileira que vivia sob uma ditadura decadente, mas que ainda tentava manter-se e impedir o povo brasileiro de fazer suas escolhas.
 Sócrates foi figura muito presente nas manifestações pelas eleições diretas para presidente do Brasil e nunca escondeu sua visão política de esquerda. Tampouco se fez valer de sua condição de ídolo para injuriar seus inimigos políticos, mas manteve a coerência e foi sincero consigo mesmo defendendo sempre seus pontos de vista como socialista.
Agora, o Brasil perde o Doutor Sócrates.
Mas nada pode apagar a sua reluzente biografia. Sua história e sua marca de genialidade.
Ainda que alguns queiram condená-lo a um lugar social dos bêbados insanos e ingênuos, como forma de desqualificar suas posições políticas de esquerda.
Os mais conservadores dirão que seus pontos de vista eram delírios de um bêbado.
A verdade é que para a elite, o jogador de futebol deve permanecer como um alienado, restringindo o seu campo de ação às esferas subalternas da sociedade.
Por isso, o Doutor Sócrates seguirá entre nós.
Permanecerá desestabilizando o status quo.
Assim como fez em vida, utilizará a genialidade dos seus lances para superar as quatro linhas do gramado e fazer do futebol uma representação das demais esferas da vida social.
Que os Brasileiros, como Sócrates, percebam que o futebol cumpre um propósito na sociedade brasileira muito maior do que uma diversão dominical.
Que a genialidade dos craques brasileiros sirva de recurso para desenvolvermos nossa sociedade e possamos construir um país com mais justiça e igualdade, sendo exemplos para o mundo na bola e na vida.

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

O Anticorinthianismo Ressentido!


Nestes últimos dias de 2011, terríveis forças mobilizam seus corpos, mentes e espíritos contra a concreta possibilidade do quinto título brasileiro do Corinthians.

Se esta mobilização estivesse limitada à urucubaca e olho gordo dos frustrados e ressentidos, bastaria invocarmos a espada de São Jorge para nos proteger do fogo do dragão.

Mas o que está em jogo é algo muito maior do que o futebol.

Desde sua fundação, na primeira década do século passado, o Corinthians provoca absoluto incômodo no establishment da sociedade paulistana.

Quando o futebol era somente um esporte da elite, o surgimento do primeiro clube assumidamente proletário desencadeou uma série de reações adversas dos mais notáveis cavalheiros da aristocracia paulista.

Para o Corinthians se estabelecer, teve de enfrentar as mais perversas forças escravocratas que tentaram de toda forma deixar o time do povo de fora da panela futebolística.

Nenhuma característica é mais marcante no time do Parque São Jorge do que a superação das adversidades. Embora nossa tarefa tenha sido árdua, nos multiplicamos e nos tornamos a maior torcida do país.

Quando o futebol virou um negócio e seu principal ativo se tornou o mercado consumidor, a fiel torcida pôde realizar o que tentou desde o início dos dias corinthianos, sustentar o seu clube e torná-lo grande.

A emancipação do Corinthians, a partir do potencial de consumo da sua torcida, possibilita dois objetivos aparentemente antagônicos: Elevar o Corinthians ao patamar dos grandes clubes de futebol do mundo, mas ao mesmo tempo não distanciá-lo da realidade dos milhões de maloqueiros. Por isso, a construção do nosso estádio justamente em Itaquera foi uma grande conquista. Teremos um dos estádios mais modernos do mundo, mas vamos permanecer no seio da Zona Leste operária. No meio da “corinthianada”.

Enquanto o Corinthians era uma espécie de “coitadinho” do futebol brasileiro (Marginal Tietê s/n), provocava apenas o escárnio dos adversários.

Mas agora, com a República Popular do Corinthians prestes a comemorar seu quinto título brasileiro e com as infinitas possibilidades futuras que se abrem para a nossa nação, o desprezo dos rivais se transformou rapidamente em ódio irracional e preconceito.

A realidade de que o Corinthians é o maior clube do Brasil é absolutamente insuportável para algumas pessoas. Como este crescimento é inaceitável, a ordem é desqualificar as vitórias corinthianas. Os rivais mais odiosos querem corromper a história e desmentir os grandes feitos alvinegros. Qualquer grande título corinthiano tornou-se objeto de difamação e boçalidade.

Os ressentidos se unem agora para evitar a insuportável nova conquista do Corinthians.

Pobres incautos!

Mal sabem vocês que a natureza do nosso poder e da nossa razão de existir está completamente desvinculada da ostentação de troféus alegóricos.

Somos uma república. Temos uma identidade social forjada no sofrimento e na superação.

O Corinthians será campeão no domingo. Vamos enfrentar esta peleja com muita honra e muita garra.

Mas ainda que não aconteça, não seria isso que desintegraria o que temos de mais valioso que é a nossa identidade.

Enquanto os falsos moralistas editam vídeos com supostos “favorecimentos” ao Corinthians, tentando fraudar a realidade e macular nossas vitórias, nossa gente sabe quantos roubos tivemos de enfrentar neste campeonato por conta da pressão que os anticorinthianos exerceram sobre árbitros.

Mas não somos do tipo que reclama da sorte chorando pelos cantos.

Nós vamos sempre à luta e vencemos nosso inimigo usando como único recurso a força dessa gente guerreira.

“Vocês” adotaram este discursinho anticorinthiano ressentido?

Invocam uma razoabilidade servil e oportunista para desqualificar o Corinthians?

Retorcem seus complexos de vira-latas que habitam em suas vísceras ao assistirem a glória do time do povo?

Pois nós não precisamos dessa frescura!

Nós vamos pra cima e enfrentamos a todos com as roupas e as armas de Jorge!

Aqui é Corinthians!