terça-feira, 25 de outubro de 2011

Vitória de Cristina Kirchner foi muito mais que econômica. Foi política.



A vitória acachapante de Cristina Fernandez de Kirchner para um segundo mandato como presidenta da Argentina deixou os setores conservadores da América do Sul notadamente perplexos.
A imprensa noticiou a vitória de Cristina como conseqüência direta dos resultados econômicos favoráveis dos últimos anos.
Embora seja verdade que a economia argentina apresente uma melhora sensível, sobretudo com baixos índices de desemprego, estes resultados não são meros acasos alcançados de maneira abstrata. Na verdade, são frutos de escolhas políticas bem sucedidas e de disputas vencidas pelos Kirchners.
Os liberais planilheiros têm por princípio reduzir os fatos sociais ao tamanho de sua compreensão.
Ou seja, a opção política, a mobilização social, a ideologia, o nacionalismo e a identificação partidária, para os ideólogos da cartilha liberal, são elementos não quantificáveis e irracionalizáveis. Portanto, quase que não existentes.
Para isso foi criado o conceito de populismo. Esta categoria se tornou conveniente para qualificarem fenômenos políticos eleitorais escolhidos pelas massas sem o crivo da razoabilidade elitista.
Os países ricos vivem a maior crise econômica dos últimos anos. Mas antes de qualquer resultado econômico, esta é uma crise política.
Vive-se uma lacuna histórica de grandes estadistas.
Os países ricos não podem superar suas crises porque seus líderes se mostram incapazes de contrariar os interesses dos grandes financistas para salvar seus capitalismos.
Enquanto a Europa sofre com uma crise muito parecida com a que vitimou os países latino-americanos nos anos 90 (estágio avançado de degradação do neoliberalismo) a Argentina surge como um exemplo de superação e recuperação, principalmente pelas escolhas políticas feitas pelos Kirchners.
Em 2001, a Argentina havia perdido 12% de seu PIB em apenas um ano. 25% da população considerada indigente.
O país foi à bancarrota depois de dez anos de um governo neoliberal ortodoxo. A profunda crise econômica desencadeou uma crise de representação política. A população saiu às ruas com uma palavra de ordem: que se vayan todos!
Mas o Kirchnerismo soube capturar de maneira eficaz o sentimento popular e, vencendo as eleições de 2003, mobilizou a sociedade (em especial os movimentos sociais) como sustentação de apoio político para as reformas na estrutura econômica e social.
Foi uma aposta política arriscada. A crise institucional ocasionada pela renúncia e fuga do ex-presidente De La Rúa exigia que a Argentina reforçasse a autoridade presidencial. Nestor e Cristina Kirchner mudaram os rumos da política econômica suspendendo o pagamento da dívida, desvalorizando o câmbio e reestruturando a atividade produtiva para alcançar o equilíbrio na balança comercial, fazendo com que o incremento das exportações fosse a mola de propulsão da recuperação do mercado interno. A parceria estratégica com o Brasil foi central para os resultados.
Internamente, os governos dos Kirchners enfrentaram a resistência desleal e violenta da imprensa local que articulava os setores mais conservadores da sociedade. Cristina sofreu uma violência muito maior que a de Nestor. O preconceito e a conspiração foram as armas de seus inimigos. Até mesmo a defecção de seu vice-presidente da república, no momento mais delicado de seu governo (crise com os ruralistas), a presidenta Cristina enfrentou com valentia.
Os Kirchners dobraram a aposta e aprovaram uma nova lei de mídia que buscava regular o setor.
A reversão do modelo neoliberal implantado na América do Sul como uma agenda econômica estabelecida pelos países do centro, mais o enfrentamento político aberto com a grande mídia (nem de perto comparável com o caso brasileiro) levou a uma guerra ideológica aberta em que todas as armas foram usadas.
Talvez por isso, ao chegar à campanha eleitoral, a imprensa já estivesse praticamente sem munição.
O adversário inicial de Cristina, Ricardo Alfonsín, procurando um espaço político fértil em que pudesse enfrentar o kirchnerismo – que encontrou forças extraordinárias após a morte de Nestor – caiu na armadilha eleitoreira, buscando guarida na direita decadente. Conseqüentemente, diminuiu seu tamanho político e saiu da eleição menor do que entrou.
Prova disso é que o socialista Hermes Binner superou as expectativas e conquistou quase 17% dos votos. Ao final, Binner contou inclusive com a manifestação de apoio da grande mídia que diante da inevitável derrota cinicamente apoiou o socialista para buscar guarida em parte da intelectualidade que apoiava o candidato.
Os 54% dos votos alcançados por Cristina depois de quatro anos de conspirações diárias contra seu governo nos mostram que esta vitória foi muito maior do que econômica. Foi política. A população argentina votou em peso na presidenta fazendo uma escolha decisiva para o futuro e revitalizando seu apoio à Cristina.
Encontrou em sua líder uma corajosa estadista. Figura em extinção no mundo de hoje.  

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