segunda-feira, 10 de outubro de 2011

O mercado do luxo se alimenta da desigualdade social


Hoje foi a vez da Luigi Bertolli, Emme e Cori serem apanhadas pela Superintendência Regional do Trabalho. Embora não sejam grifes de luxo, vale a reflexão proposta neste post publicado originalmente em 2011. As empresas argumentam que desconhecem como é fomentada sua cadeia produtiva, comprando seus produtos de confecções terceirizadas. Então tá.

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A Polícia Federal desarticulou um esquema de importação ilegal de carros de luxo.
A empresa  de fachada mantinha conexões íntimas com a máfia internacional.
Mas para os felizes compradores dos carrões de luxo, alguns deles jogadores de futebol, músicos famosos e celebridades de revista, pouco importa operar comercialmente com grupos de criminosos. O que vale mesmo é receber vantagens tentadoras na compra de automóveis que custam centenas de milhares de reais. Ainda que estejam conscientes da prática de crime de sonegação fiscal.
Ano passado, a empresária Tânia Bulhões, do grupo Tânia Bulhões Home, importadores de artigos de decoração de luxo, foi condenada a quatro anos de prestação de serviços comunitários, acrescidos do pagamento de 1,2 milhões de reais por crimes de formação de quadrilha, descaminho, falsidade ideológica e crime contra o sistema financeiro nacional.
Anteriormente, a empresária Eliana Tranchesi, também havia sido presa pelos mesmos crimes. O caso provocou perplexidade por se tratar do templo do luxo paulistano. A Daslu havia construído um palacete num bairro “nobre” de São Paulo reunido num mesmo lugar as grifes mais badaladas e caras do mundo da moda.
Mês passado, os consumidores da grife Zara ficaram impressionados ao saber que na cadeia produtiva da calça jeans, bolivianos escravizados em oficinas clandestinas não recebiam mais de 0,25 centavos por costurar o vestuário de grife.
No imaginário nacional a sonegação fiscal não é considerada um crime. Durante anos, as elites se  acostumaram a serem beneficiárias do Estado e confundirem as coisas públicas e privadas.
As relações privadas antecedem a construção das instituições públicas no Brasil. Durante séculos, as elites se habituaram a receber favores do Estado e organizá-lo conforme seus interesses.  Para a elite, o Estado sempre foi uma ferramenta de extensão de seus domínios e influência.
Dessa forma, a cobrança de tributos e a exigência de obrigações legais, causam incômodo e estranhamento por parte daqueles que não se vêem como cidadãos iguais aos demais no cumprimento de responsabilidades e na garantia de direitos.
O mercado de luxo se alimenta da desigualdade social. A aquisição de pertences que se caracterizam não somente pelo seu valor de uso, mas pela ostentação de uma grife, tem o intuito de distinguir o consumidor da ampla maioria. É uma espécie de crachá de diferenciação, capaz de abrir portas e deixar claro que o indivíduo que usa determinada marca pertence a uma casta superior da sociedade. Em troca, o cidadão ganharia garantias sociais extraordinárias, pois “cada um sabe seu lugar” na sociedade.

Confesso que conheço muito pouco (ou quase nada) sobre grifes e marcas.

No entanto, não me incomodo com as prioridades alheias. Pouco me importa se um indivíduo pague dez vezes mais caro por um produto que lhe parece interessante.
Mas considero uma cafajestagem dispor de pequenas fortunas para comprar futilidades e economizar na hora de pagar os impostos dos quais dependem toda a sociedade.
Obviamente, existe uma distorção na organização tributária brasileira. Muitos pequenos e médios empresários são esmagados por uma carga escorchante de impostos.
 A classe pobre, proporcionalmente, paga muito mais impostos e sequer tem a chance de sonegar.
Existe uma concepção geral de que o Estado é corrupto e o mercado é honesto. Os políticos são maus e os indivíduos são bons (todos eles).
Obviamente, a lógica do Estado não estaria desconectada das outras esferas da vida social. Ao contrário, o Estado reproduz as regras de uma ordem estabelecida em que a vantagem privada antecede o fortalecimento da organização coletiva.

Como se vê, os vilões não são somente os políticos. Aliás, estes são meros reflexos de uma ordem social que se impôs de cima para baixo, a partir das elites, permeando toda a estrutura da vida nacional.
O Brasil só poderá se desenvolver de verdade com justiça social. E essa justiça depende do cumprimento das leis e da igualdade entre os indivíduos na aplicação do direito.
Aos que esbanjam dinheiro comprando artigos de luxo, sugiro que reservem um orçamento para o pagamento de tributos.
Não dá mais pé o sujeito comprar um automóvel de trezentos mil reais e licenciar o carro no Acre pra pagar menos IPVA e não receber as multas. Ou uma madame pagar vinte mil reais em um vestido e reclamar da carga tributária..
Lembro-me daquela propaganda do cartão de crédito. Calça Zara 1,5 mil, vestido da Daslu 20 mil, vaso importado pela Tânia Bulhões 35 mil, carro contrabandeado 350 mil. Recolhimento de impostos: não tem preço.



4 comentários:

  1. Você reclama porque não tem dinheiro pa compra na daslu. Se tivesse duvido que ia reclamar.

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  2. Puxa. Isso é muito simples: aí, seu prego, você tá é com inveja!
    Mas eu opino que até pode ser. O autor (e eu também) podemos estar com inveja. Mas isso não desautoriza a crítica.
    A sonegação é crime hediondo, principalmente porque se apresenta (ou se esconde) junto com a ostentação, a empáfia.
    Aí e digo: sonegando é fácil progredir.
    Jackson Filgueiras

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  3. Excelente crítica que não se vê por aí. Ninguém entra profundamente na questão como seu blog. Tá bom demais. Não se incomode com as críticas e siga a diante com esse espaço para os espiritos livres.

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  4. o problema reside também na concepção que há de "artigo de luxo". Aparentemente, um automóvel, no Brasil, é um artigo de luxo. Veja bem, se você tivesse o equivalente a 16 mil dólares ou cerca de 27 mil reais, você preferiria comprar um Fiat Uno, basicão, ou um Toyota Corolla, ambos zero km, modelo 2012? Pois então, no Brasil, um carro tido como "popular" custa estes 27 mil reais (ou 16 mil dolares), enquanto na Europa e nos EUA, o Corolla custa este mesmo valor, sendo exatamente o mesmo carro que é comprado aqui por não menos que 60 mil reais.
    Artigo de luxo? Eu acho que nem tanto... carro de luxo é Mercedes, BMW, Ferrari, Rolls Royce, e por ai vai.
    Pense bem novamente: e se tirássemos os impostos sobre o valor do automóvel, o Corolla, por exemplo, aqui no Brasil, sairia por cerca de 20 mil dólares, ou perto de 36 mil reais. Ok, os calculos nao estao exatos, mas é possível ter uma ideia.
    Solução? Simples... o problema não são exatamente os impostos sobre tudo o que consumimos, mas a maneira com que eles sao embutidos em cada etapa da cadeia produtiva, fazendo com que paguemos sempre o dobro por tudo que "lá fora" custa o preço que eu diria que é justo para ser pago.

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