quinta-feira, 15 de setembro de 2011

Rock in Rio ou Jingle in Rio?

O primeiro Rock in Rio foi um momento especial para a cultura brasileira.
Ocorrido nos últimos dias da ditadura militar (1964-1985), transmitia para os jovens do Brasil a esperança de dias melhores.
O sentimento mais prazeroso da juventude é a oportunidade de vencer, conquistar, descobrir e eventualmente perder e se esborrachar no chão. Mas sempre com liberdade de escolha e algum sentido de protagonismo social.
O Rock and Roll tocado para milhares de jovens concentrados em um grande espaço público pode parecer coisa banal hoje em dia, mas ao final do governo militar era uma conquista deliciosamente grande. Poder gritar, xingar, mandar os milicos ao escambau e saber que no outro dia teríamos um novo governo trazia a sensação de que a história estaria nas mãos de cada um e que de um jeito ou de outro seríamos felizes.
O Brasil perdeu muito, mas temos que admitir que muitas coisas estão melhores. Ainda longe do que gostaríamos, mas vivemos em país melhor.
Os anos oitenta ficaram conhecidos como a “década perdida”, sob o ponto de vista econômico no Brasil.
A década de noventa também ficou marcada pelos baixos índices de crescimento econômico e alto desemprego, frutos da implantação do modelo neoliberal.
O crescimento econômico dos últimos anos – que evidentemente não se reflete em um ganho para todos os cidadãos – foi aguardado por mais de duas décadas e nos permite visualizar um momento de marcante mobilidade social.
O Rock in Rio 2011 vem nos mostrar como estamos entorpecidos por este crescimento econômico baseado no poder de consumo dos indivíduos.
É evidente que este crescimento continua sendo desejável, mas o poder e o desejo de compra são asfixiantes quando subordinam a cultura, a educação, o cumprimento das leis e o respeito pelo próximo.

A personagem Lady Kate do humorístico Zorra Total exprime bem este momento particularmente interessante com aquela frase engraçadinha: “TO PAGANDO”!
Existem mais de uma centena de produtos licenciados com a marca do Rock in Rio. E não são somente camisetas e chaveiros. Agora vemos celulares, cartões de crédito e automóveis com a marca do festival.
Tantos produtos sendo vendidos simultaneamente trazem a sensação de que ao invés de rock ouviremos Jingles in Rio.
A marca do festival torna-se mais valiosa do que as próprias atrações dos palcos. Ou seja, as pessoas parecem estar mais dispostas a consumir a experiência do festival do que contemplarem a música que estará sendo tocada.
Os artistas mais famosos do mundo têm vindo constantemente tocar no Brasil. Não é pra menos, pesquisas comprovam que o brasileiro é o povo que mais paga por shows no mundo todo, até porque Europa e Estados Unidos estão em crise.
Os valores são absurdos, mas ainda assim é preciso fazer plantão em frente ao computador para comprar algum ingresso vendido na internet. Em poucas horas eles desaparecem.



Este “conforto” contraria o próprio espírito do rock, mas não contraria o espírito da grana.
As pessoas esperam muito mais do que rock, elas querem pirotecnia. Luz, fogos, dança, ação.
O U2 não participa do Rock in Rio, mas em seu show, quando se ouve a canção “Sunday Blody Sunday” pouco importa o massacre inglês contra os católicos irlandeses. O negócio é gritar UHUUU e esperar os novos efeitos especiais.
Eu não acho que em um show de Rock deva haver um minuto de silêncio em respeito à nenhuma chacina, também não sou contra ninguém se divertir. Apenas provoco os leitores à reflexão.
Aliás, convido os leitores a refletirem sobre a não reflexão. Os indivíduos não podem pensar porque senão ficam tristes.  Não adianta a música vir carregada de intenção. É necessária uma parafernália capaz de distrair o expectador ao ponto de impedir que ele pense na sua própria razão de existência. Deve-se evitar a dor a todo custo. Então tira o pé do chão, levanta a mãozinha, bate na palma da mão e quem tá feliz dá gritoooooooo!


2 comentários:

  1. Meu amigo o rock in rio é um show feito por um empresário e como todo empresário quer tirar o todo lucro que pode da marca. O outro Rock in Rio também foi assim e ter sido feito no ultimo ano da ditadura foi mera coincidência.

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  2. Edu, entendo perfeitamente. Não é um protesto contra o rock in rio. A empresa tem todo direito de lucrar e as pessoas todo direito de assistir. Coloco aqui uma visão pessoal e um manifesto desgosto. Talvez esteja ficando velho e rabujento mesmo. Obrigado pela visita. Volte sempre.

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